Temer começa esta semana nova estratégia pela PEC da Previdência

O presidente Michel Temer começa esta semana uma série de entrevistas para diminuir as resistências da população ao texto em tramitação na Câmara que muda as regras de aposentadoria

Com a missão de convencer a população de que a reforma da Previdência não é algo tão ruim assim, o presidente Michel Temer resolveu apelar para todos os canais possíveis de comunicação. Temer será entrevistado, hoje, em Brasília, pelo apresentador Amaury Júnior, que estreará um programa na TV Bandeirantes no sábado. Na quinta, Temer viajará para São Paulo para ser sabatinado por Silvio Santos e pelo apresentador Ratinho. Reuniu-se ontem com o pastor Valdemiro Santiago de Oliveira, fundador da Igreja Mundial do Poder de Deus. E hoje recebe o pastor José Wellington, presidente da Igreja Evangélica Assembleia de Deus em São Paulo. Tudo para engatar o discurso no segmento evangélico.

Temer quer empresários, apresentadores, influenciadores e pastores unidos na tarefa de afastar as resistências à reforma. Segundo interlocutores, essa é a grande obsessão do presidente. Desde o ano passado, o governo tem se amparado em pesquisas realizadas pela Secretaria de Comunicação da Presidência mostrando que vem diminuindo a resistência da população às mudanças nas regras da aposentadoria. O Correio mostrou, em dezembro, que antes das denúncias contra Temer, 61% eram contrários à reforma e apenas 14% defendiam alterações. No fim do ano, os que rejeitavam a ideia somavam 30% e os que defendiam, 26%.
Ainda assim, o governo não conseguiu convencer os deputados a analisar a matéria antes do recesso parlamentar e foi obrigado a apresentar uma nova data — desta vez, 19 de fevereiro, logo após o carnaval. Por isso, a pressa do presidente de divulgar a ideia na televisão para que os deputados, ainda no recesso e junto às respectivas bases eleitorais, percebam se houve nova mudança de humor da população.
O Planalto sabe que são públicos distintos. Amaury Júnior fala mais à alta classe paulistana, os empresários e endinheirados. Ainda assim considera que o esforço vale a pena, alegando que o discurso do “fim dos privilégios” só afeta os servidores públicos mais abastados, o que excluiria o empresariado e os banqueiros paulistanos, integrantes da classe social que assiste e aparece no programa do apresentador.

Direitos

No caso de Silvio Santos e Ratinho, o foco é a outra ponta da pirâmide. É garantir que as pessoas mais carentes, sobretudo aquelas situadas nas classes D e E, tenham a certeza de que não perderão direitos com a reforma da Previdência. Para isso, a equipe econômica já fez diversas concessões, como a exclusão dos inscritos no Benefício de Prestação Continuada (BPC) e dos aposentados rurais da lista de pessoas atingidas pelas reformas. Na conversa que teve com Silvio Santos na semana passada, Temer ouviu do apresentador: “Eu não entendo o que vai ser votado. Se eu entender, a população também vai compreender”, prometeu.
Ontem o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, reforçou que o rebaixamento do rating brasileiro anunciado pela Standard & Poor’s aumenta ainda mais a responsabilidade dos parlamentares. “Sem que nós venhamos a aprovar uma modernização da nossa Previdência, que a transforma em uma Previdência mais justa, e menos desigual, o Brasil tem poucas chances de viver um futuro de prosperidade e quase que está condenado a um futuro de incertezas”, disse Marun.
O ministro reforça a estratégia do governo de apelar à população como uma maneira de pressionar os deputados a votar a favor da reforma. “Aqueles setores mais lúcidos da sociedade brasileira estão cada vez mais certos e convencidos da necessidade da aprovação da reforma e já começam, digamos assim, a manifestar e até a pressionar parlamentares no sentido de que seja aprovada”, assegurou. Marun não condena que alguns parlamentares estejam receosos em dizer sim à reforma por causa das eleições. E diz que, por isso, é salutar que o movimento favorável parta da sociedade, para dar mais legitimidade ao debate.
Embora todos os principais articuladores do governo ainda estejam de recesso, isso não significa que não estejam trabalhando. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por exemplo, defendeu a aprovação da reforma, mas buscou ser cauteloso quanto à contabilidade de votos. “É preciso esperar o fim do mês para ter uma opinião mais clara”, disse Maia, em entrevista ao Correio. Marun confirmou que está, constantemente, conferindo a planilha de votos. “É só o que eu faço o dia todo, né?”, brincou.

Análise da notícia
Atrações populares


Praticamente estagnado na conquista de votos desde setembro do ano passado, o governo resolveu mudar a estratégia de convencimento e passou a pressionar de fora para dentro. E usou uma tática conhecida e já adotada por diversos governos, especialmente aqueles cujos titulares não têm o dom da comunicação direta: apelar para a participação em programas populares.

Neste quesito, uma das grandes vitrines é o Programa do Ratinho, com suas atrações populares, seus quadros de gosto muitas vezes duvidoso, mas com um poder de interlocução nas classes D e E impressionante. Temer vai lá, Dilma Rousseff já foi, o petista Fernando Haddad, quando era candidato à prefeitura de São Paulo também. Até mesmo o ex-presidente Lula, um dos poucos políticos brasileiros que mantêm uma interlocução direta com a população, apareceu na atração do SBT, na primeira entrevista após a descoberta de um câncer na laringe, em 2012.

Silvio Santos também, ano após ano, vem mantendo sua capacidade de comunicação com a população. Durante os governos militares, por exemplo, quando seu canal ainda se chamava TVS — o SBT foi criado em 1981 —, o apresentador mantinha um quadro “a semana do presidente”, que apresentava as ações do general que ocupava, à época, o cargo no Palácio do Planalto. (PTL)

“Eu não entendo o que vai ser votado. Se eu entender, a população também vai compreender”
Silvio Santos, apresentador, durante conversa com Michel Temer, na semana passada
Fonte:  Correio Braziliense
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