STF: Estrangeiro tem direito a benefício assistencial

Decisão beneficia idoso e portador de deficiência que não tenha meio de prover sua existência.

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal fixou nesta quinta-feira (20/4) que é legal o direito de estrangeiro residente no país, que não tenha meios para prover sua existência ou de tê-la provida pela família, receber benefício assistencial de um salário mínimo mensal. A medida vale para pessoas com deficiência e idoso que comprovem não ter condições de sustentar sua sobrevivência.

Os cálculos do governo apontam um impacto anual de R$ 160 milhões por ano aos cofres públicos.  Os ministros entenderam que a Constituição, ao estabelecer o benefício, não fez distinção entre brasileiros e estrangeiros, garantindo uma espécie de direito universal na assistência social e que o auxílio respeita outro preceito constitucional o da dignidade humana.

Os ministros estabeleceram a seguinte tese: “Os estrangeiros residentes no país são beneficiários da assistência social prevista no artigo 203, inciso V da Constituição Federal (CF) uma vez atendidos os requisitos constitucionais e legais.’

A decisão tomada pelo no recurso extraordinário 587970 terá efeito a outros 478 casos que estavam nas instâncias inferiores aguardando uma definição do STF.

O caso foi levado ao STF pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) que recorreu contra decisão da 1ª Turma Recursal do Juizado Especial Cível Federal da 3ª Região, que condenou o instituto a conceder à estrangeira Felícia Mazzitello Albanese, 67 anos e residente desde 1952 no país, o benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da CF.

O juizado entendeu que à legislação ordinária cabe apenas definir os critérios para aferição da miserabilidade, não sendo lícito limitar o benefício nos termos pretendidos pelo INSS.

O instituto de previdência argumentou que, embora o artigo 5º da CF estabeleça a igualdade de direitos entre brasileiros e estrangeiros, o disposto no artigo 203 não seria autoaplicável. Sustenta que nacionais e estrangeiros não estão em idêntica situação. Citou ainda que, em apoio desta tese, o fato de terem sido estendidos aos portugueses residentes no país os mesmos direitos dos cidadãos brasileiros, com isso significando que aos demais não seriam assegurados iguais direitos.

Relator do caso, o ministro Marco Aurélio Mello defendeu que o constituinte ao garantir a assistência social não fez distinção entre brasileiros e estrangeiros e ressaltou o caráter universal do auxílio. O ministro citou artigos da Constituição que trazem explicitamente a diferenciação de direitos para estrangeiros. “A assistência social será prestada a quem necessitar sem restringir beneficiário”, disse o relator. “Constituinte instituiu obrigação do Estado em prover assistência aos desamparados”, completou.

Segundo o ministro, “observem que a ninguém ter sido dada a escolha de nascer nessa quadra e nessa sociedade, mas estamos todos unidos na construção do propósito comum. O estrangeiro inserido na comunidade participa do esforço mútuo”.

Ele ressaltou que o importante neste caso é que o estrangeiro atenda aos requisitos, como ser idoso e não ter condições de se sustentar.

O ministro Ricardo Lewandowksi criticou o INSS, afirmando que ficou espantando com o instituto defendendo uma tese “retrógada”. “Essa tese confronta a tradição de acolhimento do estrangeiro e afronta de maneira absolutamente direta dois importantes dispositivos da Constituição.”

Ex-ministro da Justiça do governo Temer, Alexandre de Moraes disse que conviveu com a questão no Executivo e que são poucos estrangeiros que pedem ao direito. O ministro ressaltou que não é preciso exigir na questão o princípio de reciprocidade de outros países.

IMPACTO

Em sustentação oral no STF, a Advocacia Geral da União apontou que o impacto estimado é de R$ 60 milhões de acréscimo ano, segundo o senso de 2010. Para o governo, a lei expressamente dispõe e trata dos benefícios estendidos aos cidadãos e pelo decreto cidadãos são brasileiros natos ou naturalizados e a extensão desse benefício a estrangeiros dependeria de lei específica estendendo ao estrangeiro. A extensão não prevista em lei sem a previsão de reciprocidade e sem prévia fonte de custeio.

Além disso, o procurador Cláudio Pereira, afirmou que o Brasil já acolhe os estrangeiros na assistência social, mas o princípio optado no Brasil é pela restrição aos cidadãos. Os estrangeiros podem receber, por exemplo, o bolsa família.

Já o advogado da italiana, Alexandre Triches, afirmou que não se pode confundir assistência social e previdência social. “Assistência social não é deficitária. A assistência social não tem contribuição, mas isso não significa que não há custeio. Estrangeiro não contribui, mas isso não significa que não haja o custeio”, afirmou.

No final, o advogado questionou o que acontecerá com os estrangeiros caso o STF não conceda tal benefício. “Eles serão levados de volta a seus países de origem”?

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, começou a sua manifestação afirmando que “Um homem muda o mundo e um mundo mudado muda o homem”. A frase foi usada para anunciar que a PGR mudou o seu entendimento e agora pede o desprovimento do recurso. No processo, a manifestação anexada pela PGR era pelo provimento do recurso.

“A leitura do 203, IV, da Constituição Federal não permite interpretação restritiva que só brasileiro pode ser beneficiado”, afirmou.

Janot ainda rebateu o argumento do INSS de que países vizinhos estariam gerando movimento migratórios que poderia onerar o Estado.

“Financiamento existe. E pelos princípios constitucionais, não nos parece constitucionalmente possível interpretar concessão de benefício construindo muros entre países de interpretação e de preconceito de modo a não permitir que ser humano no Brasil não tenha o mesmo tratamento de outro porque não teve a sorte ou azar de ter nascido no Brasil”, concluiu.

Participando do processo como Amicus Curiae, a Defensoria Pública da União representada por Carlos Eduardo Barbosa Paes, de janeiro de 2017 até abril de 2017, dos 624 requerimentos de assistência jurídica da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), apenas quatro foram de estrangeiros, o que representa 0,6%.

Fonte:https://jota.info

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