STF discute constitucionalidade de gratificações baseadas em multa tributária

Os Auditores-Fiscais da Receita Federal do Brasil estão mobilizados há cerca de dois anos pela implementação de um bônus de eficiência que tem como paradigma a remuneração dos fiscos estaduais. Entretanto, a constitucionalidade das gratificações baseadas em multas tributárias começa a ser questionada, como já ocorre em Rondônia.

Naquele estado, o Recurso Extraordinário 835.291 – RO discute a constitucionalidade de dispositivo legal que destina parte da arrecadação de multas tributárias a Auditores Fiscais do Estado de Rondônia, na forma de gratificação de produtividade vinculada – pagamento de adicional custeado por 40% das multas arrecadadas.

Após ter ciência do fato, a Diretoria da DS/Rio decidiu fomentar o debate junto aos filiados, evitando a perda de todo o nosso esforço de mobilização – ou, pior, que nosso sistema remuneratório seja contestado.

Consequências – A partir da declaração da inconstitucionalidade pelo STF, uma das consequências possíveis é deixarmos de receber a gratificação. Existe, ainda, o risco de sermos obrigados a devolver todos os valores recebidos sob tal rubrica.

Considerando a gravidade desse fato novo, a Diretoria Executiva Nacional (DEN) e o próprio Sindifisco Nacional têm o dever de fomentar esse debate com a categoria. Precisamos ter certeza de que a nossa remuneração está sendo construída sobre alicerces sólidas, e não sobre areia movediça.

Parecer no Recurso Extraordinário dos Fiscais de Rondônia
Reproduzimos, abaixo, trechos do parecer do Subprocurador-Geral da República Odim Brandão Ferreira, no Recurso Extraordinário 835.291 – RO, que argui a inconstitucionalidade de Lei estadual de Rondônia instituindo pagamento de gratificação a agentes fiscais, com base em multas arrecadadas.

Em que pese ser uma ação referente ao sistema remuneratório de Rondônia, quem se manifesta é a Procuradoria-Geral da República, que tem a obrigação de se pronunciar sempre que há questionamento sobre a constitucionalidade de matéria encaminhada para discussão no STF.

(…) “A lei estadual também viola o art. 37, xiii, da CR, porque atrela receita a pagamento do funcionalismo. Por extensão, ofende-se também o caput do art. 37, por dar relevância ao interesse pessoal do componente da fiscalização tributária, animando-o a exercer o poder de império estatal com inspirações distintas do interesse público. Põe-se sob suspeição todo ato de execução de lei, com ingerência estatal sobre patrimônio jurídico do contribuinte, que se motive em algo além do que o estrito cumprimento dessa.”

(…) “A diretiva da impessoalidade do art. 37 da CR impede a criação de parcelas de remuneração de servidores vinculadas à arrecadação de multas tributárias: os direitos fundamentais de defesa, como a propriedade, não podem ser expostos a decisão de servidor parcial, assim entendido não apenas aquele que tem diferenças pessoais com os administrados, mas também aqueles que têm algum interesse no substrato material do assunto a cujo respeito são chamados a opinar.”

(…) “A situação dos autos é ainda mais grave, porque o aumento de arrecadação em que se baseia a vantagem funcional fica a cargo do grupo de servidores responsáveis pela constituição dos créditos tributários. Como essa atividade estatal interfere na esfera jurídica do contribuinte, por meio de obrigação jurídica compulsória, degrada-se o princípio da imparcialidade. Afinal, garante-se a propriedade do particular contra ingerências do Estado. (…) A fortiori, é demasiado submeter o patrimônio do contribuinte à vantagem classista do funcionalismo público, animado, por interesse privado e pessoal, pelo aumento da arrecadação de multas tributárias.”

(…) “A diretiva da impessoalidade do art. 37 da CR parece desrespeitada no caso, porque aqui se trata de atividade estatal capaz de afetar os direitos fundamentais de defesa dos contribuintes, isto é, as funções exercidas pelos agentes públicos no caso representam restrição de direitos fundamentais, em especial da propriedade, entendida como qualquer direito subjetivo de conteúdo patrimonial, para o fim do art. 5°, x, da CR5. Ao menos no domínio dos direitos fundamentais de defesa, que visam proteger o cidadão do ataque do Estado, parece correto afirmar que a impessoalidade é a ausência de interesse próprio do agente público sobreposto ou em conflito com o interesse do cidadão. Numa palavra, aqui, a impessoalidade é sinônima da imparcialidade. E, nesse sentido, nada interessa verificar se o fator de distúrbio da imparcialidade do servidor decorre da diferença pessoal que mantenha com o administrado ou de interesse no substrato material do assunto a cujo respeito é chamado a opinar. Caso se prefira designar as coisas com outra nomenclatura, a impessoalidade diz respeito tanto à pessoa de quem decide, como à pessoa afetada pela decisão. Importante a reter, contudo, é a impossibilidade de os direitos de defesa dos cidadãos serem postos em risco pela atividade parcial de agentes públicos.”

(…) “Atos de aplicação e de execução da lei não devem ser motivados por inspirações desse jaez. A intensidade da fiscalização tributária não deve ser medida na base do maior ou menor interesse pecuniário de seus agentes, porque o exercício do império, de que decorrem as prerrogativas do poder público, é teleologicamente dirigido.”

Fonte: Cabresto sem nó

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