Penal: Prisão em 2ª instância é tema polêmico com muitas idas e vindas
A execução provisória da pena é um assunto que desde 1941 suscita debates.
O tema da prisão em 2ª instância, que até outrora cozinhava em fogo baixo no Supremo, tomou proporções maiores com a possibilidade do ex-presidente Lula ser preso. O impasse sobre a execução provisória da pena está longe de ser algo recente. A história nos mostra como o posicionamento sobre este assunto mudou ao longo dos anos.
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1941
O ano de 1941 foi importante para determinar o destino daqueles que cometeram algum tipo de crime. Isso porque o CPP foi promulgado e, a partir dele, foram regulados temas como o inquérito policial, prova, interrogatório e confissões, além de ficar estabelecido que o juiz pode aplicar, provisoriamente, medidas de segurança ainda no curso do inquérito mediante representação da autoridade policial.
O CPP teve como base um contexto histórico autoritário, com o Estado Novo, e não partia da presunção de inocência do acusado, mas sim de um juízo de antecipação de culpabilidade. Isso implicava que uma simples denúncia, por exemplo, já poderia colocar alguém atrás das grades. O que vigorava, na época, era isso: para recorrer da decisão de prisão, o condenado necessariamente teria que estar preso.
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(Fonte: Diario de Noticias, 1941)
- 1973
A história começou a mudar quando o delegado Sérgio Paranhos Fleury teve a prisão preventiva decretada. Fleury liderou o chamado “Esquadrão da Morte”, em São Paulo, e atuou como delegado do Dops durante a ditadura militar. O caso do delegado alterou a lei processual penal, em regime de urgência, e deu origem à lei 5.941/73, conhecida como lei Fleury.
Ela abriu a possibilidade do réu primário, e de bons antecedentes, aguardar o julgamento em liberdade. A lei Fleury dispunha que a prisão preventiva somente deveria ser determinada em caso de necessidade, o que é, na verdade, uma das bases do princípio da presunção da inocência.
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(Fonte: Luta Democratica, 1976)
Anos mais tarde, a lei foi duramente criticada sob o argumento de que ela permitia a impunidade de pessoas influentes. Ela foi alterada e a lei 6.416/77 entrou no lugar. A norma alterou o sistema de prisão provisória, ainda mais com o art. 310 do CPP, com sua antiga redação, que tratava da fiança, que passou a ser aplicada apenas em casos excepcionais.
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(Fonte: O Estado de S. Paulo, 1981)
- 1988
O princípio da presunção da inocência foi legitimado anos mais tarde com a CF de 1988. Mas as alterações legislativas, ao longo dos anos, não deram uniformidade ao entendimento do tema. De um lado, estava o CPP que discorria sobre a antecipação de culpabilidade; do outro uma CF recém formulada na qual consta a presunção de inocência até o trânsito em julgado da sentença. Ficou a questão: pode ser presa antes que todos os recursos sejam exauridos sem que isso afete a presunção da inocência?
A súmula 9 do STJ, que vigorava na época, respondia que sim. A exigência da prisão provisória, para apelar, não ofendia a garantia constitucional da presunção de inocência.
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(Fonte: O Globo, 1988)
- 2009
Entretanto, o STF mudou este entendimento e estabeleceu o direito do condenado em segunda instância de recorrer em liberdade quando julgou o HC 84.078 que tratava do caso de um condenado por homicídio.
A ementa daquele julgado ficou assim redigida:
“EMENTA: HABEAS CORPUS. INCONSTITUCIONALIDADE DA CHAMADA “EXECUÇÃO ANTECIPADA DA PENA”. ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ART. 1º, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
- 2016
Anos mais tarde, com o julgamento de outro HC, a jurisprudência sobre o tema mudou novamente. O habeas em questão (HC 126.292) discutia a legitimidade de ato do TJ/SP que, ao negar provimento ao recurso exclusivo da defesa, determinou o início da execução da pena. Por maioria, 7 votos a 4, o plenário mudou jurisprudência da Corte, afirmando que é, sim, possível a execução da pena depois de decisão condenatória confirmada em segunda instância.
Atualmente, aguarda-se que as duas medidas cautelares em ADCs (43 e 44), de outubro de 2016, sejam julgadas no mérito, mesmo com a Corte tendo reconhecido via plenário virtual a repercussão geral na matéria (ARE 964.246) e entendido pela reafirmação do entendimento a favor da execução antecipada.
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Referência:
MENDONÇA, A. B. Prisão e outras medidas cautelares pessoais. São Paulo: Editora Método, 2011.
Fonte: Migalhas