Países relatam experiência com tributação ambiental
O Fórum Internacional Tributário (FIT), realizado em São Paulo desde segunda-feira (4/5), com a participação de mais de 600 pessoas, entre eles 20 especialistas de 14 países, encerrou seus painéis debatendo tributação, bem-estar e meio ambiente.
O painel contou com a participação dos palestrantes Ignasi Puig Ventosa, da Universidad de Barcelon e do Green Budget Europe / Fundació ENT, e Rodrigo Pizzarro, da Universidade de Santiago de Chile, tendo como debatedora Maria Bernadete Gutierrez, do IPEA. O painel foi coordenado por Grazielle David, do INESC.
“É importante nos preocuparmos em ter uma reforma tributária que, além de solidária, seja voltada para o meio ambiente, com instrumentos econômicos eficazes na proteção ambiental”, destacou Grazielle David, lembrando ainda que o Brasil é o país que mais utiliza agrotóxicos no mundo e registra tragédias ambientais, como a do município de Mariana, em Minas Gerais.
Segundo o especialista Iganasi Puig Ventosa, é necessário pensar em uma reforma mais global, em que o sistema tributário proporcione o aumento da receita advinda dos impostos verdes, principalmente em relação a energia. “Sendo assim, a ideia de uma reforma fiscal ecológica é estruturar uma abordagem mais completa do ponto de vista ambiental, econômico, voltado para a competitividade e criação de empregos”, explicou o especialista.
Ao analisar o Brasil, Ventosa faz alguns alertas. “O Brasil não está tão bem nos quesitos ambientais. Como porcentagem do PIB, o Brasil está em 0.6%, enquanto os países da OCDE estão três vezes maior. Sabemos que houve mudanças recentes nas leis, mas o Brasil continua bem abaixo da média”, destacou.
Segundo o estudioso, os impostos verdes podem ser efetivos e eficientes para o comportamento cultural. Na Itália, por exemplo, a coleta de lixo nas residências é realizada por meio de contêineres localizados nas ruas. Para depositar o resíduo, existe um cartão magnético que mostra quantas vezes é utilizado. Assim, é possível saber quanto cada cidadão descartou no lixo e quanto será cobrado de imposto. Isso estimula o consumo consciente, bem como medidas de reciclagem e reaproveitamento dos resíduos.
Outros países da Europa já desenvolveram mecanismos para mensurar a quantidade de lixo produzido em cada residência. Na Catalunha, já existia uma lei que regulamentava esta questão, mas somente a partir de 1994, quando passou a ser tributado, foi que os cidadãos começaram a se preocupar com essa questão. Em Barcelona, após começar a cobrar pelos sacos plásticos, o consumo diminuiu em 90%.
“O marco internacional indica uma transição para uma economia verde, que vai corrigir algumas falhas do nosso modelo econômico. Não podemos esperar que o mercado faça isso sozinho, por isso a necessidade de políticas públicas bem estruturadas. A fiscalização ambiental é justificada do ponto de vista ambiental e econômica”, enfatizou.
Rodrigo Pizzarro, da Universidade de Santiago do Chile, apresentou como se deu a implantação de impostos ambientais em seu país. Segundo relatou, nos últimos 20 anos, havia no Chile uma ideia associada ao consenso de Washington de que o sistema tributário deveria ser neutro. “O sistema não precisa ser neutro, ele pode ter papel de equidade. Se aceitarmos que o sistema não é neutro, podemos começar a discutir de que maneira podemos gerar incentivos que vão elevar o desenvolvimento econômico”, argumentou.
Segundo apresentou Pizzarro, mesmo que em última instância uma reforma tenha o objetivo de obter recursos, ela deve promover desenvolvimento econômico sustentável, equitativo e integrado. As Nações Unidas, conforme explicou, definiu vários objetivos por meio da Agenda 2030 voltados para esse desenvolvimento. “Todos os países da América Latina são signatários dessa agenda”, lembrou.
A importância da mudança de comportamento das pessoas é fundamental nesse processo. Para Pizzarro, a humanidade vai entrar em um século crítico, o que acarretará mudanças ambientais associadas a mudanças econômicas e sociais. “Contaminação química, atmosférica, perda de biodiversidade, mudança no uso da terra, ciclo do nitrogênio, contaminação dos oceanos”, são, segundo o economista, tipos de desafios que serão enfrentados no futuro. Todos, segundo ele, associados a processos de consumo e produção, que são insustentáveis. “Na verdade, são de consumo insustentável”, enfatizou.
Antes, a política ambiental resolvia seus problemas com regulação, mas esse não é o caminho para mudar comportamentos. A alternativa para resolver esse problema é criar instrumentos fiscais e tributários que gerem práticas sustentáveis. “Essa é a lógica por trás da reforma fiscal que fizemos no Chile”, contou.
Na América Latina, das dez cidades mais contaminadas, cinco são chilenas. Isso fez com que uma nova política fosse estabelecida. Os principais problemas do país são a contaminação atmosférica associada ao uso de veículos e a emissão de gases de efeito estufa. “A proposta foi realizada dentro do contexto de reforma tributária maior”, abordou Pizzarro.
No Chile foram instituídos três impostos ambientais tendo com base o diagnóstico local. A tributação foi aprovada em 2014, implementada em 2017 e os primeiros resultados da mudança serão colhidos este ano.
O primeiro imposto é do CO2, com a cobrança de US$ 5 por tonelada de gases emitidos. Outra taxa é sobre a emissão de poluentes locais (PM, SO2 e NOx – óxidos de nitrogênio e enxofre e de material particulado). O terceiro é o imposto dos combustíveis, calculado com base nas emissões potenciais do veículo, e de restrição de veículos, cobrado na compra de novas unidades.
O processo de efetivação dessa proposta levou tempo, conforme relatou Pizzarro. “Implementar o imposto verde requer um trabalho conjunto dos ministérios envolvidos”, disse. O economista finalizou declarando a importância da interação das reformas para o avanço das políticas ambientais.
Fonte: ANFIP