Pagar sucumbência a advogados públicos é inconstitucional, decide juiz federal

Repassar honorários de sucumbência a advogados públicos provoca enriquecimento sem causa, coloca os profissionais em situação de conflito de interesses em relação aos entes que representam e viola o princípio da remuneração por subsídio em parcela única. A decisão é do juiz Bernardo Lima Vasconcelos Carneiro, da 15ª Vara Federal do Ceará.

O pagamento de honorários de sucumbência para advogados públicos foi incluído no Código de Processo Civil de 2015, no parágrafo 19 do artigo 85. Trata-se de uma grande mudança em relação ao sistema anterior, que, além de não prever o pagamento da verba a advogados concursados, determinava o pagamento da sucumbência pela parte vencida à vencedora, e não ao seu advogado.

Quando aprovados, os honorários foram comemorados pela Ordem dos Advogados do Brasil e por membros da Advocacia-Geral da União, as grandes articuladoras do novo sistema. O argumento era que a falta de pagamento da sucumbência para procuradores públicos colocava os profissionais em situação de desigualdade em relação a suas contrapartes privadas e, na prática, enviava ao Estado dinheiro que lhes pertencia.

Para o juiz Bernardo Vasconcelos Carneiro, entretanto, os honorários de sucumbência são verba remuneratória e não podem ser pagos a funcionários públicos. O artigo 135 da Constituição Federal diz que os integrantes das carreiras jurídicas de Estado devem ser remunerados por subsídio em parcela única invariável. E os honorários incrementam a remuneração dos advogados públicos de acordo com os casos que patrocinam, e conforme o valor da causa.

Carneiro disse ainda que, ao receber os honorários, os advogados públicos ficam com dinheiro que ficaria com a União, não fosse o CPC. “O esdrúxulo cenário jurídico instalado pelas mencionadas inovações legislativas é esse: na vitória do ente estatal, os honorários sucumbenciais pertencem aos advogados públicos; já na derrota, o pagamento da verba sucumbencial fica a cargo exclusivamente do Erário, vez que inexistente qualquer compensação entre esses ganhos e perdas.”

Curva para o alto
O próprio juiz decidiu consultar como tem sido o repasse, por meio do Portal da Transparência, o pagamento da sucumbência a membros da AGU tem aumentado mês a mês: o benefício foi R$ 4 mil em maio de 2017 e, em outubro, já era de R$ 6 mil.

Considerando que o salário inicial da carreira é R$ 22 mil e a curva do pagamento das verbas pela AGU é ascendente, analisou o juiz, a sucumbência também é inconstitucional porque pode violar o teto remuneratório do funcionalismo público, fixado no salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (hoje em R$ 33,7 mil).

Vasconcelos Carneiro também diz que há conflito de interesse em receber a verba. A pessoa física que ocupa um cargo de advogado da União sempre terá interesse em patrocinar uma causa, já que, no caso de vitória, receberá um dinheiro a mais.

O problema é que o cargo também vem com a obrigação de seguir o princípio da legalidade estrita. Portanto, se o particular tem razão no litígio, o procurador federal ou advogado da União deveria desistir da causa – assim como se a posição do governo contrariar jurisprudência pacificada do Supremo ou do Superior Tribunal de Justiça.

Clique aqui para ler a decisão.
Cumprimento de Sentença 000483-10.2014.4.05.8101

Fonte:  CONJUR

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