Os riscos da obsessão de Temer pela reforma da Previdência

Murilo Aith*

Uma das principais bandeiras do Presidente interino, Michel Temer, a reforma da Previdência pode sair a fórceps. Isso porque nos últimos dias foi noticiado que a equipe do Governo estuda, como saída alternativa, alterar, por meio de um despacho normativo federal, a interpretação das regras da aposentadoria para os segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Esse caminho seria escolhido caso o Congresso Nacional demore ou não aprove as mudanças propostas.

Ou seja, a reforma das regras atuais da Previdência virou uma obsessão, uma meta, um “surto de responsabilidade”. E, agora, se confirmada essa posição do governo uma espécie de medida ditatorial pode ser utilizada para mudar as regras para milhões de segurados do INSS no meio do caminho. Um verdadeiro abuso do poder.

Conforme noticiado, o Presidente considera possível fazer a reforma da previdência a jato, através de um despacho normativo do governo federal, explicando que a Constituição Federal é clara ao estabelecer que os anos de contribuição e a idade mínima são ambas condições necessárias e não excludentes para se aposentar pelo INSS. Esse despacho seria alvo de impugnação no Supremo Tribunal Federal, que daria a palavra final.

Trata-se de uma ação de extrema falta de sensibilidade com os trabalhadores brasileiros. As propostas do governo já não visam qualquer Justiça social, pois aumentar a idade mínima da aposentadoria para 63 ou 65 anos não condiz com a realidade do nosso mercado de trabalho. Até porque depois dos 50 anos, o trabalhador brasileiro dificilmente consegue uma colocação no mercado formal. A imensa maioria é obrigada a realizar atividades informais para sobreviver. Além disso, os trabalhadores, sejam eles rurais ou urbanos, começam a trabalhar e contribuir com a Previdência Social muito cedo, alguns desde os 14 anos.

A reforma da Previdência, da maneira como está sendo desenhada, já é extremamente danosa aos trabalhadores. As mudanças mais drásticas valerão para quem tiver até 50 anos, tanto na iniciativa privada como no setor público. Acima desta faixa etária haverá um “pedágio” para quem quiser se aposentar, a chamada regra de transição, prevendo um período adicional de trabalho de 40% a 50% do tempo que falta para que se tenha direito ao benefício. Ou seja, de qualquer maneira, o trabalhador terá que trabalhar e contribuir mais.

E é exatamente por este cenário preocupante que o governo sabe que terá muitas dificuldades políticas para aprovar as medidas técnicas necessárias. Entretanto, o governo não pode impor essas alterações sem um amplo e aberto debate sobre as mudanças com a sociedade.

E, caso abra o debate, Temer e sua equipe deverão esclarecer efetivamente quais os reais valores gastos pela Seguridade Social e também o que ela arrecada de tributos para o seu custeio. Até porque o déficit da Previdência, constante anunciado, não é verdadeiro.

Portanto, é importante ressaltar que não há como fazer uma reforma previdenciária coerente se não for estabelecido um amplo debate com a sociedade. A proposta vem sendo debatida internamente pelo governo e deve ser, necessariamente, estendida todos os atores sociais, como os aposentados, a Defensoria Pública, a Ordem dos Advogados do Brasil, associações de classes, acadêmicos, Ministério Público, centrais sindicais, entre outros, para chegar numa proposta mais justa. Senão, corremos o risco de um enorme retrocesso social capitaneado por uma afronta aos direitos já conquistados pelos aposentados.

*Murilo Aith é advogado de Direito Previdenciário e sócio do escritório Aith, Badari e Luchin Sociedade de Advogados

Fonte: Previdência Total

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