Direito de greve no serviço público pode voltar a discussão após as eleições

A recente greve de servidores públicos federais – que envolveu diversas categorias e aconteceu em várias partes do país – trouxe de volta à discussão a necessidade de regular as paralisações desses trabalhadores. Mas a forma como a regulamentação deve ser feita não é consensual (há diferentes projetos de lei tramitando no Congresso) e gera polêmica entre os parlamentares.

O governo, por sua vez, não apenas defende a fixação de regras como também cogita apresentar um projeto. Na sexta-feira (21), a ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, disse que houve abusos durante a greve e cobrou do Congresso Nacional uma definição sobre o assunto. O direito de greve dos servidores está previsto na Constituição, ou seja, desde 1988, mas até hoje não foi regulamentado por meio de uma lei específica.

Entre os projetos de lei que tramitam no Senado destacam-se o PLS 710/11, do senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), o PLS 83/07 e o PLS 84/07, ambos do senador Paulo Paim (PT-RS).

A proposta de Aloysio Nunes, que conta com relatório favorável do senador Pedro Taques (PDT-MT), fixa uma série de exigências para que os servidores possam entrar em greve. Uma delas determina que pelo menos 50% dos funcionários têm de continuar trabalhando – percentual que aumenta para 60% nos casos de paralisação em serviços relacionados a saúde, abastecimento de água e energia e transporte coletivo, entre outros, e sobe para 80% quando a greve afeta a segurança pública. Se tais percentuais não forem respeitados, a greve poderá ser considerada ilegal.

Aloysio Nunes também propõe que os grevistas sejam obrigados a comunicar a paralisação com pelo menos 15 dias de antecedência. E determina que, caso a greve seja considerada ilegal pelo Judiciário, o retorno dos servidores ao trabalho deverá ocorrer em até 24 horas – prazo contado a partir da intimação da entidade sindical responsável.

O senador do PSDB argumenta que “a sociedade tem se mostrado favorável à regulamentação” e ressalta que o funcionalismo público é bancado pelos cidadãos, que podem ser prejudicados quando tais paralisações atingem setores como saúde, segurança e previdência social.

Mudança de rumo – O projeto de Aloysio Nunes estava pronto para ser votado na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado (CCJ), já com as alterações propostas por Pedro Taques, quando foi retirado de pauta após o senador Paulo Paim (PT-RS) solicitar que a matéria também seja discutida em outras duas comissões – uma delas presidida pelo próprio Paim: a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado (CDH).

Paim fez a solicitação logo após audiência pública realizada no início do mês, na qual diversos sindicalistas criticaram o projeto de Aloysio Nunes. Na ocasião, Paulo Barela, da Central Sindical e Popular (CSP-Conlutas), declarou que a proposta visa “amordaçar e restringir o direito de greve dos servidores”. Nessa mesma linha de raciocínio, Paim disse temer que a regulamentação acabe se transformando em uma proibição desse direito.

– Não vamos aceitar a proibição das greves. Regulamentar é uma coisa, proibir é outra – disse ele em entrevista à Agência Senado.

Durante a audiência, vários sindicalistas recordaram que alguns dos representantes do governo, que agora questionam as greves e pedem sua regulamentação, são os mesmos que participaram das greves no Grande ABC que antecederam a fundação do PT.

Atraso – Ao ser questionado se sua iniciativa seria uma forma de atrasar a tramitação da matéria – Paim solicitou que o projeto de Aloysio Nunes seja discutido na CDH e na Comissão de Assuntos Sociais do Senado (CAS), para só então retornar à CCJ -, o senador gaúcho negou essa hipótese e lembrou que há dois projetos de sua autoria, anteriores, que já poderiam ter sido aprovados (justamente o PLS 83/07 e o PLS 84/07).

– Meu primeiro projeto sobre o assunto foi apresentado há 20 anos e ninguém quis aprová-lo. Não sou eu quem está atrasando isso – respondeu ele, acrescentando que “não se pode, da noite para o dia, tirar um projeto da cartola e querer aprová-lo com urgência”.

Os dois projetos de Paim, que tramitam em conjunto, receberam parecer favorável da senadora Ana Amélia (PP-RS) no ano passado, quando estavam sendo examinados na CAS.

Como relatora, Ana Amélia retirou alguns itens e promoveu modificações em outros. Por exemplo: as propostas originais de Paim indicavam como essenciais apenas os serviços e atividades caracterizados pela “urgência médica, necessários à manutenção da vida” (para efeito de delimitação do direito de greve). Ana Amélia incluiu nesse grupo as atividades policiais relacionadas à segurança pública, os serviços de controle de tráfego aéreo, de distribuição de medicamentos pelo Sistema Único de Saúde e os de necropsia, liberação de cadáver e exame de corpo de delito.

Atualmente, os projetos de Paim tramitam na CCJ. Segundo o presidente dessa comissão, senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), as duas propostas serão incluídas na pauta da CCJ assim que o Senado retornar ao ritmo normal de atividades – ou seja, após as eleições municipais.

Projeto do governo – O Executivo, por sua vez, não apenas defende a regulamentação como também vem anunciando a possibilidade de apresentar ao Congresso um projeto de lei de sua própria autoria. Foi o que informou no início do mês o secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, Manoel Messias Melo, durante a audiência pública promovida pelo Senado.

Essa possibilidade também foi cogitada pelo advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, e pela ministra-chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann. Todos afirmam que há estudos e discussões sobre o assunto dentro do governo.

– O Congresso deve à sociedade o debate e a definição [da regulamentação] – declarou Gleisi Hoffmann na sexta-feira (21) durante entrevista à TV estatal NBR.

A ministra também disse que, “com os abusos que tivemos nessa greve recente, certamente isso terá reflexos na discussão e nas definições do Congresso”.

Fonte: Agafisp

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