Câmara diminui poder de ministério sobre auditores fiscais e entidades divergem
- Entidade afirma que lei aprovado pela Câmara “protege” auditores contra punições
A aprovação de um projeto de lei na Câmara dos Deputados que estabelece “proteções” a servidores da Receita Federal, na última terça-feira (22), acirrou divergências entre entidades ligadas a funcionários do Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União e da Receita Federal. O projeto que regulamenta a carreira de auditores fiscais determina, entre outras coisas, que a polícia deve informar “imediatamente” a chefia da Receita Federal caso algum funcionário seja investigado criminalmente e que os auditores só podem ser punidos administrativamente pela própria corregedoria da Receita, exceto em alguns casos.
O projeto de lei 5894/2016, enviado à Câmara dos Deputados em julho deste ano pelo Poder Executivo, reorganiza as carreiras dos servidores da Receita Federal. Na última terça-feira (22), após quase seis meses de tramitação, os deputados da comissão especial que avaliava o projeto aprovaram um substitutivo ao projeto original em caráter terminativo, ou seja, sem necessidade de aprovação pelo plenário da Câmara. O projeto deve seguir ao Senado. Se o projeto for aprovado lá sem alterações em relação ao texto enviado pela Câmara, segue para a sanção presidencial.
Dois dos pontos mais polêmicos do projeto aprovado pelos deputados são os que tiram a possibilidade de o Ministério da Transparência punir servidores da Receita Federal e o que obriga as polícias a informar a chefia da Secretaria da Receita Federal “imediatamente” nos casos em servidores são investigados criminalmente. Pelo que diz a lei, servidores da Receita só poderiam ser punidos pela corregedoria da própria Receita, exceto nos casos em que houvesse indícios de fraude ou dolo.
Para o presidente da Unacon (Sindicato Nacional dos Auditores e Técnicos Federais de Finanças e Controle), Rudinei Marques, esses dispositivos protegem os servidores da Receita Federal. “Isso coloca os auditores da Receita acima da lei, porque, em geral, todos os servidores federais podem ser investigados pelo Ministério da Transparência. Do ponto de vista do direito, a sociedade não pode tolerar esse tipo de proteção”, disse Rudinei.
Já o presidente da Unafisco (Associação Nacional dos Auditores da Receita Federal do Brasil), Cléber Cabral, discorda de Rudinei e diz que não há proteção aos servidores do órgão.
“A CGU (antigo nome do Ministério da Transparência) nunca investigou os servidores da Receita. Não faz sentido imaginar que, a partir de agora, isso iria mudar. De qualquer forma, não defendemos nenhum tipo de proteção, apenas entendemos que isso era algo que nunca foi feito”, afirmou.
Rudinei cita o escândalo do Carf (Conselho de Administração de Recursos Fiscais), investigado pela Operação Zelotes, como um exemplo de como a corregedoria da Receita Federal não funciona como deveria.
“Se você pegar o caso do Carf, com aquele volume de pessoas envolvidas, você vai ver que a corregedoria da Receita não funciona da forma como tinha que funcionar. Mostra que a corregedoria não tem dado as respostas que a sociedade exige na apuração de desvio”, diz Rudinei.
A Operação Zelotes, deflagrada pela Polícia Federal em 2014, investiga um esquema de fraude no Carf, órgão responsável pelo julgamento de processos fiscais. As suspeitas são de que conselheiros do Carf recebiam propina de empresas para perdoarem dívidas fiscais junto à União.
Cleber Cabral discorda mais uma vez. Segundo ele, a corregedoria da Receita Federal é uma das mais “ativas” do funcionalismo público federal e que uma de suas principais “armas” é o acesso a informações fiscais. “A corregedoria da Receita é uma das mais ativas. É das que mais investiga, mais demite de todo o funcionalismo. Sobretudo porque ela tem acesso a dados fiscais e faz um controle rígido sobre a evolução patrimonial dos servidores”, afirmou.
Questionada sobre o assunto, a Receita Federal, por meio de sua assessoria de imprensa, disse concordar com a aprovação dos dois dispositivos. “[Nossa posição é] de concordância. Esta não é uma prerrogativa só da RFB (Receita Federal do Brasil), pois outros órgãos como AGU, PF, etc têm suas corregedorias próprias”, afirmou. Segundo o órgão, entre 2002 e 2015, 540 servidores da Receita foram demitidos pela corregedoria.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o Ministério da Transparência disse não ter um posicionamento oficial sobre o projeto porque ele “não foi submetido à apreciação” do órgão.
Fonte: Noticias.uol