Auditoras-Fiscais conquistam direito à remoção em casos de risco de morte
A publicação da Portaria RFB 340/2023 é o primeiro resultado concreto das cobranças feitas por Auditoras-Fiscais durante os debates promovidos pelo Sindifisco Nacional para marcar o Dia Internacional da Mulher, de 7 a 9 de março de 2023, em Brasília. A norma, publicada no último dia 14 de agosto, inclui o risco à integridade dos servidores ou seus familiares como hipótese de remoção, considerando que a Lei 8.112 não prevê tal possibilidade.
Durante os debates coordenados pelas diretorias de Defesa Profissional e de Assuntos Parlamentares, a Auditora-Fiscal Marielle Dornelas, atualmente diretora-secretária da Delegacia Sindical do Ceará, pôde compartilhar sua própria história como vítima de violência doméstica. Para garantir sua segurança, a administração providenciou sua remoção de ofício para outra localidade, onde sua permanência era condicionada ao exercício de função de chefia.
A remoção definitiva só aconteceu seis anos depois, contando com o importante apoio da DS/Ceará, que elaborou petição com base na Lei Maria da Penha e em que já solicitava a alteração na legislação, visando beneficiar também outras servidoras. Nesse intuito, realizaram, ainda, eventos e reuniões com diversos atores, envolvendo administradores da Receita Federal, promotores públicos, servidores públicos em geral e, em especial, a própria Maria da Penha, a cearense que dá nome à Lei 11.340/2006.
A Auditora considera que contar a sua história na Semana da Mulher do Sindifisco foi um importante passo para que a demanda fosse de fato ouvida, já que na plateia estavam Auditoras-Fiscais que integram a cúpula da Receita Federal: Ellis Regina Leite (chefe da Assessoria de Acompanhamento Legislativo da Receita Federal), Rosa da Conceição Moreira (ouvidora) e Denize Canedo da Cruz (coordenadora-geral de Gestão de Pessoas). Sensibilizada com a história, Denize Canedo garantiu que o risco de vida seria contemplado em nova portaria de remoção, o que se concretizou agora.
A diretora de Defesa Profissional, Auditora-Fiscal Nory Celeste, também avalia que a estratégia foi acertada. “Trazer Marielle para os nossos debates foi fundamental para que essa questão, que afeta também outras Auditoras, ecoasse e chegasse à cúpula da Receita, que também aceitou o convite do sindicato para participar da discussão. Agora, vamos lutar para que essa possibilidade de remoção por risco de vida esteja prevista em lei, para dar segurança definitiva para essa questão”, avalia.
Aproveitando o convite do Sindifisco para virem a Brasília, Marielle e outras integrantes do coletivo Fisco com Elas entregaram pessoalmente uma carta escrita por elas ao secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, cobrando que a violência doméstica e o risco de morte fossem considerados pela administração, a fim de proteger a vida das mulheres da Casa. A vice-presidente do Sindifisco Nacional, Auditora-Fiscal Natália Nobre, e a diretora de Assuntos Parlamentares, Patrícia Fiore, representaram a Direção Nacional na ocasião.
As cobranças não se restringiram à Semana da Mulher. Em pelo menos duas ocasiões, o tema foi debatido entre a Direção Nacional e a cúpula da Receita. Em uma delas, o presidente do Sindifisco, Auditor-Fiscal Isac Falcão, e o diretor de Assuntos Jurídicos, Auditor-Fiscal Cleber Magalhães, apresentaram uma minuta de portaria garantindo a remoção de mulheres vítimas de violência doméstica, independentemente de haver vaga no local de destino. Além de Barreirinhas, Denize Canedo e Juliano da Justa Neves (subsecretário de Gestão Corporativa) participaram da reunião.
“Já sabíamos que a administração estava trabalhando para incluir o risco de morte como justificativa para remoção. Mas entendemos que o caso das mulheres vítimas de violência doméstica é uma situação específica e merece ser tratada como tal. Essa diferenciação não foi contemplada na Portaria 340/2023. Mas não podemos deixar de reconhecer o avanço que ela representa. De qualquer forma, a semente foi lançada, e a administração pode no futuro aperfeiçoar a norma”, pondera Cleber Magalhães.
“É importante uma atenção especial às mulheres vítimas de violência doméstica, onde há uma maior vulnerabilidade. Quando se trata de violência em geral, a pessoa pode ir para casa, contratar segurança e até certo ponto ficar protegida enquanto toma as providencias necessárias. Na violência doméstica, o inimigo está dentro de casa. Uma situação muito delicada que merece um olhar diferenciado. Essa especificidade deve ser pensada ainda, pois o trâmite da remoção nesses casos tem que ser rápido e sigiloso”, corrobora Marielle.
Assim como Nory, a diretora da DS/Ceará considera que o ideal seria a garantia do direito à remoção de vítimas de violência doméstica em lei. Nesse sentido, ela defende uma mudança na Lei Maria da Penha, que trata o tema como uma “prioridade”. Mas entende que a Portaria 340 já é um importante avanço.
A diretora de Defesa da Justiça Fiscal e da Seguridade Social, de Políticas Sociais e Assuntos Especiais, Maria de Lourdes Nunes Carvalho, também vê com entusiasmo a nova norma da Receita Federal. “É um avanço e beneficia homens e mulheres. Além de ser uma prevenção contra os feminicídios”, afirma.
“Agora, é acompanhar a eficiência da aplicação da norma na prática e continuar a luta para divulgar o exemplo da Receita Federal, a fim de que seja seguido por outros órgãos do governo, ampliando o amparo legal para todas as servidoras e servidores públicos do Brasil”, planeja Marielle.