0,5% dos brasileiros concentram quase 45% do PIB

Estudo analisa tributação, desigualdade e concentração de renda e patrimônio

Contraste entre a favela de Paraisópolis e o bairro do Morumbi, em São Paulo. (Foto: Tuca Vieira / Oxfam Brasil)

Brasil tem um dos mais injustos sistemas tributários do mundo e uma das mais altas desigualdades socioeconômicas entre todos os países, onde os mais ricos pagam proporcionalmente menos impostos do que os mais pobres, criando uma das maiores concentrações de renda e patrimônio do planeta. Essa relação direta entre tributação injusta e desigualdade e concentração de renda e patrimônio é investigada pelo pesquisador Evilásio Salvador no estudo Perfil da Desigualdade e da Injustiça Tributária, produzido pelo Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) com apoio da Oxfam Brasil, Christian Aid e Pão Para o Mundo.

Foram considerados os quesitos de sexo, rendimentos em salário mínimo e Unidades da Federação. O texto busca identificar o efeito concentrador de renda e riqueza, a partir das informações sobre os rendimentos e de bens e direitos informados à Receita Federal pelos declarantes de IR no período de 2008 a 2014, referentes às informações dos anos-calendário de 2007 a 2013.

Os dados da Receita Federal analisados para o estudo revelam, por exemplo, que do total de R$ 5,8 trilhões de patrimônio informados ao Fisco em 2013 (não se considera aqui a sonegação), 41,56% pertenciam a apenas 726.725 pessoas, com rendimentos acima de 40 salários mínimos. Isto é, 0,36% da população brasileira detém um patrimônio equivalente a 45,54% do PIB do Brasil e com baixíssima tributação. Considera-se, ainda, que essa concentração de renda e patrimônio está praticamente em cinco estados da federação: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná, agravando ainda mais as desigualdades regionais do país.

O estudo aponta ainda que os contribuintes com rendas acima de 40 salários mínimos representam apenas 2,74% dos declarantes de IR, mas se apropriaram de 30,37% do montante dos rendimentos informados à Receita Federal em 2013. Além disso, dos R$ 623,17 bilhões de rendimentos isentos de Imposto de Renda em 2013, R$ 287,29 bilhões eram de lucros e dividendos recebidos pelos acionistas – se submetidos à alíquota máxima da atual tabela progressiva do Imposto de Renda (27,5%), esses recursos gerariam uma arrecadação tributária extra de R$ 79 bilhões ao Brasil.

As informações tornadas públicas pela Receita Federal, a partir da disponibilização da base de dados “Grandes Números das Declarações do Imposto de Renda das Pessoas Físicas”, contribuem para uma maior transparência sobre a questão tributária no país, que a tempo ocupa lugar na agenda pública das propostas de reformas. Os dados ampliaram um novo olhar sobre a desigualdade social no Brasil e reforçam ainda mais a injustiça tributária no país, pois mesmo o Imposto de Renda, que deveria ser o fiador de um sistema tributário mais justo, acaba contribuindo para maior concentração de renda e riqueza em nosso país.

Baixe aqui o estudo completo (arquivo PDF).

Os dados da Receita Federal são fartos para revelar uma casta de privilegiados no país, com elevados rendimentos e riquezas que não são tributados adequadamente e, muitas vezes, sequer sofrem qualquer incidência de Imposto de Renda.

Outra medida fundamental seria a implementação do Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF), previsto na Constituição e não regulamentado até hoje. É uma oportunidade para a prática da justiça tributária, por aplicar corretamente o princípio constitucional da capacidade contributiva, “onerando o patrimônio dos mais ricos no país”, conforme afirma Evilásio no estudo, que advoga ainda a introdução da progressividade no Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de quaisquer Bens ou Direitos (IT-CDM). Outras medidas apontadas como importantes são a tributação maior para bens supérfluos e menor para produtos essenciais para a população.

Uma proposta de reforma tributária no Brasil deveria ser pautada pela retomada dos princípios de equidade, de progressividade e da capacidade contributiva no caminho da justiça fiscal e social, priorizando a redistribuição de renda. As tributações de renda e do patrimônio nunca ocuparam lugar de destaque na agenda nacional e nos projetos de reforma tributária após a Constituição de 1988. Assim, é mais do que oportuna a recuperação dos princípios constitucionais basilares da justiça fiscal (equidade, capacidade contributiva e progressividade).

A tributação é um dos melhores instrumentos de erradicação da pobreza e da redução das desigualdades sociais, que constituem objetivos essenciais da República esculpidos na Constituição Federal de 1988.

O Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) vem apontando que o sistema tributário brasileiro tem operado no sentido da maior concentração de renda no país. O estudo As implicações do sistema tributário brasileiro nas desigualdades de renda, produzido pelo Inesc em 2014, demonstrou as implicações negativas do sistema tributário brasileiro sobre as desigualdades no país, destacadamente no agravamento das distâncias entre pobres e ricos, mulheres e homens, negros e brancos. A metodologia adotada naquele estudo valeu-se dos micro- dados da PNAD/2011, pois inexistiam dados oficiais que permitissem dimensionar de forma direta o impacto da regressividade dos tributos nas desigualdades de gênero e raça.

Uma das questões inerentes à questão tributária no Brasil é a irrisória tributação do patrimônio: somente 1,40% do PIB, o que equivale a 4,18% da arrecadação tributária realizada em 2011. Nos principais países capitalistas, os tributos sobre o patrimônio representam mais de 10% da arrecadação tributária, como, por exemplo, no Canadá (10%), no Japão (10,3%), na Coreia (11,8%), na Grã-Bretanha (11,9%) e nos EUA (12,15%).

A questão da tributação sobre o patrimônio vem sendo fortemente pautada pelo debate internacional, com a publicação da obra de Thomas Piketty, traduzida em português como “O Capital no Século XXI”.8 Piketty, a partir da análise de dados tributários, demonstra – com vasta evidência empírica – um aumento espetacular da desigualdade de renda das principais economias mundiais. O autor faz um apelo, especialmente, por impostos sobre a riqueza, se possível em es- cala mundial, a fim de restringir o crescente poder da riqueza hereditária.

Fonte:  oxfam.org.br

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