Incidência do Pis/Cofins em operações com frete

1. Breve histórico da legislação do PIS e da COFINS

Como sabido, com o propósito de eliminar a cumulatividade do PIS e da COFINS, o que, em tese, aumentava o custo e onerava a cadeia de produção, o Governo Federal alterou a dinâmica de recolhimento das referidas contribuições para o denominado regime não-cumulativo, nos termos das regras estabelecidas nas Leis nos 10.637/02 e 10.833/03.

Assim, com o advento das Leis nos 10.637/02 e 10.833/03, o PIS e a COFINS passaram a incidir de forma não-cumulativa, com uma carga tributária conjunta de 9,25% (1,65% de PIS e 7,6% de COFINS). Além disso, as referidas leis também alargaram a base de cálculo das contribuições, que passaram a incidir sobre a totalidade das receitas auferidas pela pessoa jurídica.

Em contrapartida, tais Leis concederam ao contribuinte o direito de descontar créditos incidentes na aquisição de bens e/ou serviços para a consecução de suas atividades (art.  da Lei 10.637/02 e art.  da Lei 10.833/03), os quais são passíveis de compensação com a contribuição ao PIS e a COFINS calculados sobre a receita bruta auferida.

Dentro dessa sistemática não-cumulativa de PIS/COFINS, as Leis nos 10.637/02 e 10.833/03 autorizaram o contribuinte a descontar, dentre outros, créditos em relação aos bens adquiridos para revenda, aos bens e serviços utilizados como insumo na fabricação de produtos destinados à venda e ao frete na operação de venda, neste último caso, desde que suportado pelo vendedor, conforme se depreende dos art. 3os, incisos I, II e IX, das referidas Leis:

Art. 3º Do valor apurado na forma do art. 2º a pessoa jurídica poderá descontar créditos calculados em relação a:

I – bens adquiridos para revenda, exceto em relação às mercadorias e aos produtos referidos: (…)

II – bens e serviços, utilizados como insumo na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda, inclusive combustíveis e lubrificantes, exceto em relação ao pagamento de que trata o art. 2o da Lei no 10.485, de 3 de julho de 2002, devido pelo fabricante ou importador, ao concessionário, pela intermediação ou entrega dos veículos classificados nas posições 87.03 e 87.04 da Tipi

(…)

IX – armazenagem de mercadoria e frete na operação de venda, nos casos dos incisos I e II, quando o ônus for suportado pelo vendedor.

Assim, verifica-se que a não cumulatividade do PIS/COFINS pressupõe que sobre os custos e despesas relevantes para a atividade da pessoa jurídica sejam calculados os correspondentes créditos que serão utilizados para diminuir o valor a pagar a título das referidas contribuições.

2. Frete nas aquisições de mercadoria

A legislação não é clara a respeito da possibilidade de aproveitamento de créditos de PIS/COFINS sobre os custos de frete pagos pelo comprador para o transporte de mercadorias do estabelecimento fornecedor ao seu estabelecimento. No entanto, quer nos parecer que desde que o serviço de transporte esteja sujeito à incidência da contribuição ao PIS e da COFINS é possível o creditamento das contribuições sobre tais pagamentos.

Nossa posição está fundamentada na premissa de que os custos incorridos com o serviço de transporte de mercadorias do estabelecimento vendedor ao estabelecimento adquirente estão incluídos no valor de aquisição das mercadorias, mesmo quando suportado pelo adquirente, razão pela qual o crédito das contribuições seria possível com base nos incisos I e II dos artigos 3ºs das Leis nº 10.637/02 e 10.833/03, citados acima.

De fato, nas hipóteses em que o próprio vendedor arca com o custo do frete para transportar as mercadorias vendidas até o estabelecimento do comprador, é evidente que o valor do frete será um dos componentes do custo da mercadoria.

Assim, se, por exemplo, a mercadoria seria vendida por R$ 1.000,00 (mil reais) e o frete custaria R$ 100,00 (cem reais) para transportar a mercadoria até o estabelecimento do comprador, é patente que o vendedor, tendo arcado com o custo do frete, cobrará pela mercadoria R$ 1.100,00 (mil e cem reais). Sobre este último valor, no nosso exemplo, é que seriam calculados os créditos de PIS/COFINS na situação em que o vendedor é o responsável pelo pagamento do frete.

Por outro lado, não seria justo que, somente porque o comprador foi o responsável pelo pagamento do frete, a base de cálculo dos créditos de PIS/COFINS fosse menor, de modo a abranger somente o custo da mercadoria, que no nosso exemplo seria de R$ 1.000,00 (mil reais). Ao contrário, também nesta situação, os valores relativos ao frete devem compor o custo de aquisição da mercadoria, ainda que pagos diretamente ao transportador e não para o fornecedor da mercadoria.

Assim, mesmo que o frete relativo à aquisição de insumos seja contratado pelo comprador, entendemos que o crédito de PIS/COFINS deve ser calculado sobre o custo da mercadoria e do frete, sob pena de violar o princípio da isonomia.

Referido entendimento vem sendo, inclusive, adotado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil (“RFB”) em diversas Soluções de Consulta, conforme exemplos abaixo citados:

Solução de Consulta 27/08 – 3ª RRF

Incidência não-cumulativa. Direito a créditos. Frete pago na compra de mercadorias para revenda. Os custos e as despesas que irão compor a base de cálculo dos créditos para apuração do PIS/Pasep e da Cofins não-cumulativos estão elencados, de forma exaustiva, nas Leis nºs 10.637, de 2002, e 10.833, de 2003, respectivamente. O frete pago na aquisição, quando contratado com pessoa jurídica domiciliada no País e suportado pelo adquirente dos bens, considera-se incluído no valor de aquisição dos bens para revenda podendo gerar crédito do PIS/Pasep e da Cofins não-cumulativos.

SOLUÇÃO DE CONSULTA Nº 74 de 06 de Julho de 2009

ASSUNTO: Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social – Cofi

EMENTA: Não há previsão legal para desconto de crédito em relação à despesa de frete na aquisição de insumos utilizados na produção de bens destinados à venda. Entretanto, desde que a aquisição dos insumos possa gerar crédito, a despesa de frete contratado de pessoa jurídica na aquisição do insumo, sujeita à incidência da Cofins, integra o valor da base de cálculo do crédito previsto no art. § 1ºI da Lei nº 10.833, de 2003. (…)

Solução de Consulta nº 234/07 – 7ª RRF

O VALOR DO FRETE INTEGRA A BASE DE CÁLCULO NA APURAÇÃO DOS CRÉDITOS QUE COMPÔEM O CÁLCULO DA INCIDÊNCIA NÃO CUMULATIVA. O contribuinte poderá descontar créditos calculados em relação aos bens adquiridos para revenda ou utilizados como insumos na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda. O valor do frete incidente na compra destes bens integra o custo de aquisição, podendo, portanto, compor a base de cálculo na apuração dos créditos da COFINS. DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 10.833, de 2003, art. ; RIR/99, art. 289, § 1º e Instrução Normativa SRF nº 247, de 2002, art. 66.

Solução de Consulta nº 238/11

(…) A partir de 1º de fevereiro de 2004, o valor do serviço de transporte (frete) prestado por pessoa jurídica domiciliada no país contratado para transportar bens adquiridos para serem utilizados como insumo na fabricação de produtos destinados a venda podem gerar credito a ser descontado da Cofins, respeitados os demais requisitos legais e normativos pertinentes.

Solução de Consulta nº 63/10

CRÉDITO FRETE. O valor do frete pago na aquisição do insumo pode integrar a base de calculo do crédito previsto no art. II, da Lei nº 10.833, de 2003, desde que a aquisição do frete esteja sujeita a incidência da Cofins.

Vejamos que o entendimento do CARF também é nesse sentido:

Acórdão nº 3403-00.485 – 4ª Câmara/3ª Turma Ordinária

PIS NÃO-CUMULATIVO. CRÉDITO. TRANSPORTE DE INSUMOS E PRODUTOS. Os valores referentes aos fretes contratados para transporte de insumos, aplicado na fabricação de produtos, desde que prestados por pessoa jurídica domiciliada no país, podem compor o somatório dos creditos a serem descontados do PIS. Os valores referentes ao frete na operação de venda de produtos, desde que suportados pelo vendedor, podem compor o somatório dos creditos a serem descontados do PIS, a partir de 10 de fevereiro de 2004. Dispositivos legais: Lei nº 10.637, de 2002, art.  inciso 11; Lei nº 10.684, de 2003, art. 25., IN SRF nº 247, de 2002, art. 66; IN SRF nº 358, de 2003 Lei nº 10.833, de 2003, arts. IX15 e 93. TIRSO BATISTA DE SOUZA – CHEFE. (Data da Decisão: 30/03/2004.

(…)

Pois bem, feito esse enquadramento histórico, infere-se que a legislação posta expressamente permite o creditamento de valores relativos a despesas com frete de mercadorias em três hipóteses. A primeira, estabelecida no inciso I do artigo  da Lei nº 10.637/2002, refere-se ao caso de bens adquiridos para revenda, onde o frete referente à aquisição de mercadoria pode ser somado ao custo da mercadoria. A segunda hipótese é a de se entender a despesa com frete como um bem ou serviço a ser utilizado como insumo na prestação de serviço ou na produção de um bem (inciso II do artigo 3ºda Lei nº 10.637/2002). A terceira hipótese é a do inciso IX do artigo  c/c com artigo 15 da Lei nº 10.833/2003, que se refere ao frete na operação de venda quando o ônus for suportado pelo vendedor. (Grifamos e negritamos)

É relevante mencionar que encontramos uma recente posição contrária da RFB em relação à possibilidade de apropriação de créditos de PIS/COFINS no frete contratado para o transporte de produtos adquiridos pela pessoa jurídica. No entanto, trata-se de uma posição isolada e aparentemente contraditória, que a nosso ver não deve prevalecer.

Dessa maneira, diante do exposto acima, entendemos ser legítima a apropriação de créditos de PIS/COFINS relacionados ao frete contratado nas operações de aquisição de mercadorias, uma vez que o mesmo integra o custo de aquisição da mercadoria transportada, seja ela destinada à revenda ou à utilização como insumos no processo produtivo.

3. Fretes nas transferência

No presente tópico, passaremos a analisar a possibilidade de a Apropriação de créditos de PIS/COFINS em relação aos valores relacionados ao serviço de transporte nas transferências de mercadorias, sejam estas destinadas à revenda ou à utilização como insumos no processo de industrialização. Considerando as peculiaridades de cada situação, nós as avaliaremos separadamente.

– Transferências de mercadorias do Centro de Distribuição para a Fábrica: produtos destinados à utilização como insumos no processo produtivo

No que se refere ao crédito de PIS/COFINS relativo ao frete contratado para transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular, frete este contratado em momento posterior à aquisição da mercadoria, entendemos que há, também, argumentos jurídicos para defender a possibilidade de sua apropriação, apesar de esta ser uma questão muito controversa.

Em nossa opinião, o frete contratado para a transferência de mercadorias entre a Distribuidora e a Fábrica, por ocorrer durante o processo produtivo da Sociedade, deve ser considerado como um insumo à atividade produtiva da empresa, gerando o direito ao crédito de PIS/COFINS com base no inciso IIdos artigos 3os das Leis 10.637/02 e 10.833/03.

De fato, no caso em tela, toda a controvérsia gira em torno da definição do termo “insumo”, para fins de crédito de PIS/COFINS.

A verdade é que o conceito de insumo pode variar de acordo com a legislação que se analisa e os fins a que se destina.

Por exemplo, para fins de IPI, somente são consideradas como insumo aquelas mercadorias que integram fisicamente o produto final ou aquelas que sofram desgaste, dano ou perda de suas propriedades físicas ou químicas, em função da ação diretamente exercida sobre o produto em fabricação.

A RFB – apesar de já ter se manifestado no passado no sentido de que os fretes incorridos para a transferência de insumos entre filiais da mesma pessoa jurídica, no curso da produção, poderiam gerar direito a crédito de PIS/COFINS – adotou recentemente uma posição que assemelha o conceito de insumo para PIS/COFINS àquele adotado para o IPI.

Trata-se da Solução de Divergência n.º 2/11, segundo a qual “por não integrarem o conceito de insumo utilizado na produção de bens destinados à venda e nem se referirem à operação de venda de mercadorias, as despesas efetuadas com fretes contratados para o transporte de produtos acabados ou em elaboração entre estabelecimentos industriais e destes para os estabelecimentos industriais e destes para os estabelecimentos comerciais da mesma pessoa jurídica, não geram direito à apuração de créditos a serem descontados da COFINS”.

Verifica-se que por meio da Solução de Divergência trazida acima, a RFB pacificou o seu entendimento no sentido de que os fretes relativos à transferência de insumos entre estabelecimentos da pessoa jurídica não gera o direito à apuração de créditos de PIS/COFINS, nem mesmo quando a transferência é efetuada entre estabelecimentos industriais, o que pressupõe a transferência de produtos não acabados, durante o processo produtivo.

Ao assim entender, a RFB certamente está assemelhando o conceito de insumos para PIS/COFINS ao conceito adotado para fins de crédito do IPI.

No âmbito judicial, o Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) também tem apresentado entendimento contrário à apropriação do crédito de PIS/COFINS em transferências entre estabelecimentos de uma mesma pessoa jurídica:

Recurso Especial n º 1147902/RS – STJ

TRIBUTÁRIO. PIS E COFINS. REGIME DA NÃO-CUMULATIVIDADE. DESPESAS DE FRETE RELACIONADAS À TRANSFERÊNCIA INTERNA DE MERCADORIAS ENTRE ESTABELECIMENTOS DA EMPRESA. CREDITAMENTO. IMPOSSIBILIDADE.

1. Controverte-se sobre a possibilidade de utilização das despesas de frete, relacionadas à transferência de mercadorias entre estabelecimentos componentes da mesma empresa, como crédito dedutível na apuração da base de cálculo das contribuições à Cofins e ao PIS, nos termos das Leis 10.637/2002 e 10.833/2003.

2. A legislação tributária em comento instituiu o regime da não-cumulatividade nas aludidas contribuições da seguridade social, devidas pelas empresas optantes pela tributação pelo lucro real, autorizando a dedução, entre outros, dos créditos referentes a bens ou serviços utilizados como insumo na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda.

3. O direito ao crédito decorre da utilização de insumo que esteja vinculado ao desempenho da atividade empresarial. As despesas de frete somente geram crédito quando relacionadas à operação de venda e, ainda assim, desde que sejam suportadas pelo contribuinte vendedor.

4. Inexiste, portanto, direito ao creditamento de despesas concernentes às operações de transferência interna das mercadorias entre estabelecimentos de uma única sociedade empresarial.

5. Recurso Especial não provido. – destacamo

No Acórdão cuja Ementa foi trazida acima, o STJ mencionou de forma expressa que os fretes nas transferências não constituem insumos para fins de crédito de PIS/COFINS, por não caracterizar serviço utilizado na produção ou fabricação de bens, considerando ainda que o conceito de insumo deve ser entendido em estrito senso, como trata o Regulamento do IPI.

Outra corrente, tem entendido que o conceito de insumo para fins de crédito de PIS/COFINS deve levar em consideração os “custos e despesas operacionais”, dedutíveis para fins de Imposto de Renda.

Sob tal interpretação, gerariam direito a crédito de PIS/COFINS todos os custos e despesas que contribuem para a atividade de uma empresa, não necessariamente apenas durante o processo de produção de bens e serviços.

Esta posição foi adotada pelo CARF no Acórdão 3202-00.22, conforme ementa abaixo:

REGIME NÃO CUMULATIVO. INSUMOS. MATERIAIS PARA MANUTENÇÃO DE MÁQUINAS. 0 conceito de insumo dentro da sistemática de apuração de créditos pela não cumulatividade de PIS e Cofins deve ser entendido como toda e qualquer custo ou despesa necessária a atividade da empresa, nos termos da legislação do IRPJ, não devendo ser utilizado o conceito trarido pela legislação do. IPI, uma vez que a materialidade de tal tributo é distinta da materialidade das contribuições em apreço.

O jurista Ricardo Mariz de Oliveira também já defendeu a posição de que o conceito de insumo aplicável para fins de apropriação de créditos de PIS/COFINS deve assemelhar-se àquele adotado para fins de Imposto de Renda:

Neste sentido, constituem-se em insumos para a produção de bens ou serviços não apenas as matérias-primas, os produtos intermediários, os materiais de embalagem e outros bens quando sofram alterações, mas todos os custos diretos e indiretos de produção, e até mesmo despesas que não sejam registradas contabilmente a débito do custo, mas que contribuam pra a produção.(…) Mas, além dos custos absorvidos, também outros dispêndios que a prática contábil debite à despesa podem ser considerados insumos, porque são, e quanto o sejam, relacionados à produção, como, por exemplo, as seguintes espécies que possivelmente estejam contabilizadas fora do custo, embora pudessem estar dentro dele: os gastos com a vigilância da fábrica, o tratamento de efluentes e esgotos da fábrica e outros semelhantes.

No entanto, em nossa opinião, para PIS/COFINS o conceito de insumo não é tão restrito quanto para o IPI e nem tão amplo quanto o é para o Imposto de Renda.

De fato, conforme mencionado acima, as Leis 10/637/02 e 10.833/03 trazem de forma expressa a possibilidade de que não apenas bens, mas também serviços sejam utilizados como insumos. Esta possibilidade já afasta a interpretação de que somente aquilo que se considera como insumo para fins de IPI é que poderia ser considerado como insumo para fins de PIS/COFINS, na medida em que o IPI não considera serviços como insumos passíveis de crédito.

Do mesmo modo, as referidas Leis determinam que o insumo destina-se à produção de bens ou serviços, de forma que não se poderia considerar como passíveis de crédito das contribuições em análise, com base no conceito de insumos, valores que correspondam a despesas operacionais, mas que não tenham qualquer vinculação com a produção.

Dessa forma, a legislação de PIS/COFINS traz um conceito próprio do que deve ser considerado como insumo para fins de apropriação de créditos das referidas contribuições: bens e serviços utilizados na prestação de serviços e na produção ou fabricação de bens ou produtos destinados à venda.

Pode-se afirmar, então, que todos os bens e todos os serviços que sejam necessários à produção possam ser considerados como insumos passíveis de crédito de PIS/COFINS. Insumos seriam, portanto, todos os bens e serviços sem os quais não seria possível que a produção se completasse.

No caso em análise, o frete relativo às transferências entre a Distribuidora e a Fábrica poderia ser considerado um insumo passível de crédito de PIS/COFINS.

Isso porque, sem que as mercadorias fossem transferidas da CD para a Fábrica, nenhum processo produtivo seria possível, na medida em que não há, na CD, todos os equipamentos e toda a infraestrutura necessária à produção.

Assim, o frete configura-se como essencial à produção, sendo certo que sem ele a produção não se completaria. Por esta razão é que entendemos que é possível a apropriação de créditos de PIS/COFINS em relação aos fretes incorridos para a transferência de insumos durante o processo produtivo, desde que o transporte seja prestado por pessoa jurídica e as receitas auferidas com a prestação de serviço de transporte estejam sujeitas à incidência das contribuições.

Observe-se que o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (“CARF”) já havia se manifestado no sentido de que é possível a apuração dos créditos relacionados aos fretes dos produtos a serem utilizados no processo de produção, conforme abaixo:

Acórdão nº 3301-00.424- 3ª Câmara / 1ª Câmara / 1ª Turma Ordinária

(…) Portanto, hão de ser considerados os créditos oriundos de fretes sobre transferências de matérias-primas, produto intermediário, material de embalagem e serviços realizados entre filiais ou entre parceiros integrados (criadores de aves e suínos) e as filiais do contribuinte, que compõem o custo de produção do produto final, nos termos do artigo33, II, das Leis nº10.6377/02, e nº10.8333/03, o que não se confunde com atividades de transporte do produto acabado entre quaisquer estabelecimentos… – Negritos nosso

Mais recentemente, a Câmara Superior de Recursos Fiscais do CARF (“CSRF”) analisou de forma muito profunda o conceito de insumo para PIS/COFINS, tendo concluído de forma semelhante à que aqui defendemos.

No Acórdão 9303-01.740, ainda pendente de formalização, a CSRF entendeu que o conceito de insumos para PIS/COFINS não se confunde com aquele adotado para o IPI e tampouco com aquele adotado para fins de Imposto de Renda.

Ao contrário, o conceito de insumo para fins de crédito de PIS/COFINS é próprio e deve seguir o que estabelecem as Leis que regem as contribuições, de modo que “os dispêndios, denominados insumos, dedutíveis da COFINS não cumulativa, são todos aqueles relacionados diretamente com a produção do contribuinte e que participem, afetem, o universo das receitas tributáveis pela referida contribuição social. A indumentária imposta pelo próprio Poder Público na indústria de processamento de alimentos – exigência sanitária que deve ser obrigatoriamente cumprida – é insumo inerente à produção da indústria avícola, e, portanto, pode ser abatida no cômputo de referido tributo.”

Dessa forma, entendemos que há argumentos para defender que os fretes relativos à transferência de mercadorias entre o CD e a Fábrica, no âmbito do processo produtivo, pode constituir crédito de PIS/COFINS, desde que tais fretes sejam pagos a pessoas jurídicas e sofram a incidência das contribuições.

4. Transferências de mercadorias da CD para a Revenda: mercadorias destinadas à revenda

No que tange ao frete relativo à transferência de produtos destinados à revenda entre o CD e a Revenda, entende-se que tambémhá argumentos para defender a sua apropriação como créditos de PIS/COFINS.

Segundo entendemos, ambos os incisos comportariam uma interpretação que possibilitasse a apropriação dos créditos, uma vez que os valores pagos a título de frete são parte do custo da mercadoria a ser revendida, compondo o preço final do produto acabado a ser repassado ao contribuinte.

Assim, com base no inciso I dos artigos 3os das Leis n.º 10.637 e 10.833, poder-se-ia afirmar que quando se autorizou a apropriação de créditos em relação aos “bens adquiridos para revenda”, pretendeu-se que o termo “bens” englobasse todos os custos necessários para que a mercadoria fosse colocada em condições de ser revendida, o que evidentemente incluiria o custo do serviço de transporte pago na aquisição da mercadoria e nas respectivas transferências entre estabelecimentos do mesmo titular, até que a mercadoria chegasse ao local de onde seria revendida.

Dessa forma, os custos de frete incorridos pelo contribuinte nas transferências entre estabelecimentos do mesmo titular, contratados em momento posterior à aquisição da mercadoria, também poderiam gerar direito ao crédito de PIS/COFINS com base no inciso I dos artigos 3os das Leis n.º 10.637 e 10.833.

É importante lembrar que para fins do IRPJ, o artigo 289, § 1º, do Regulamento do Imposto de Renda (“RIR/99”) admite que o valor do frete deve integrar o custo de aquisição da mercadoria, sendo certo que o CARF já se manifestou no sentido de que o frete pago para transferência de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular também integram o custo de aquisição da mercadoria, como se observa:

Acórdão nº 101-82.937/92 – DO 08/05/95

Fretes entre estabelecimentos da empresa – O preço do frete de mercadorias entre os estabelecimentos da empresa complementa o custo de aquisição delas, nos termos do disposto no parágrafo único do art. 182 do RIR/80.

Nesse passo, seria possível argumentar que o custo de aquisição das mercadorias (terminologia da legislação do imposto de renda) e valor dos bens adquiridos para revenda (terminologia da legislação da contribuição ao PIS e da COFINS) seriam expressões equivalentes. Daí porque, se o valor do frete pago para o transporte de mercadorias entre estabelecimentos da empresa, em momento posterior à aquisição, integra o custo de aquisição das mercadorias para fins de IRPJ, deve integrar também o valor dos bens adquiridos para revenda para fins de cálculo dos créditos de PIS/COFINS.

Ainda que assim não fosse, entendemos que seria possível argumentar que os fretes incorridos nas transferências de mercadorias para revenda entre a CD e a Revenda poderiam ser enquadrados no inciso IX dos artigos 3os das Leis n.º 10.637 e 10.833, como “frete na operação de venda”.

Ora, nada mais justo, em nossa opinião. Se o contribuinte mantém apenas um estabelecimento, em São Paulo, por exemplo, e a partir dele efetua vendas para todos os Estados do Brasil, todo o custo de frete poderá compor o valor dos créditos de PIS/COFINS como “frete na operação de venda”. Nessa hipótese, por exemplo, o custo do frete até a Bahia seria de R$ 1.000,00 e todo este valor seria passível de créditos de PIS/COFINS.

Se em vez disso, para melhorar o prazo de entrega de mercadorias aos seus clientes, o contribuinte mantiver estabelecimentos menores em cada um dos Estados do Brasil, ter-se-ia, por exemplo, um custo de frete na transferência de R$ 900,00 até o seu estabelecimento no Estado X e mais R$ 100,00 para a entrega efetiva da mercadoria ao seu cliente.

Evidentemente, seria absolutamente injusto que o contribuinte pagasse mais PIS/COFINS, em virtude da dedução de menor valor em créditos, somente porque pretende atender melhor ao seu cliente, à medida que ambos os contribuintes, na situação trazida no exemplo, estariam em situação equivalente.

Assim, a vedação ao direito de crédito, nessa segunda hipótese, violaria o princípio da isonomia.

Entretanto, é importante mencionar que a Secretaria da Receita Federal já manifestou sua opinião de forma contrária, afirmando que as despesas incorridas para transportar produtos acabados entre estabelecimentos de mesmo titular não seriam hipótese de aproveitamento de créditos de PIS/COFINS, como se observa das Soluções de Consulta a seguir:

Solução de Consulta nº 163/06

CRÉDITO. EMPRESA COMERCIAL.

O custo de serviço de transporte de mercadorias entre a central de distribuição e as filiais, contratado por pessoa jurídica que exerça exclusivamente atividade comercial (supermercado), não gera direito a crédito nos termos do art.  da Lei 10.833, de 2003.

Solução de Consulta nº 7/07

FRETE NO TRANSPORTE INTERNO DE MERCADORIAS. EMPRESA COMERCIAL. CRÉDITO.

Não podem ser descontadas como crédito, na Contribuição para o PIS/PASEPnão-cumulativa, as despesas com frete, realizadas por empresa comercial, referentes ao transporte interno de mercadorias entre depósito e lojas.

Diante disso, embora haja argumentos para se sustentar a possibilidade de a empresa apropriar-se dos créditos de PIS/COFINS sobre os valores dos fretes pagos nas transferências de produtos acabados, tal como exposto acima, não há como deixar de apontar que o posicionamento dominante da Secretaria da Receita Federal é o de que tais valores não geram direito ao crédito.

Ademais, necessário esclarecer ainda, conforme já citado anteriormente, que já há posicionamento desfavorável ao contribuinte pelo próprio Superior Tribunal de Justiça, que julgou pela impossibilidade do crédito decorrente de despesa de frete entre estabelecimentos da mesma empresa, como se vê da Ementa ao Recurso Especial nº 1147902/RS – STJ, transcrita anteriormente.

De todo modo, da análise dessa decisão, supõe-se que a empresa pretendeu o reconhecimento do direito de crédito em razão do princípio da não-cumulatividade e por defender que tem direito ao crédito relativo à despesa de frete relacionada à venda de mercadoria, constituindo essa despesa insumo de sua operação. Com efeito, a decisão relata que a parte sustenta violação aos incisos II e IX do artigo  da Lei 10.833/03. O STJ entendeu que esse frete não estaria relacionado diretamente à operação de venda da mercadoria (afastando a aplicação do inciso IX, sem apreciar, porém, o argumento relacionado ao princípio da isonomia) e que não caracterizaria insumo, por não estar vinculado ao próprio desempenho da atividade empresarial (afastando a aplicação do inciso II).

Objetivamente, este é o único precedente sobre a matéria no STJ. A 1ª Turma do STJ ainda não se manifestou acerca do tema. Assim, não se pode considerar a existência de jurisprudência sedimentada em torno do assunto.

Nesse sentido, por se tratar de matéria controvertida e especialmente em razão de não haver jurisprudência pacificada com relação à legitimidade de apropriação dos créditos relativamente aos valores pagos a título de frete entre os estabelecimentos do mesmo titular e ao frete contratado em momento posterior à aquisição da mercadoria, não afastamos o risco de eventual lavratura de auto de infração, pela Receita Federal, com aplicação de multa e juros.

Entendemos, porém, que há argumentos para defender a apropriação de créditos de PIS/COFINS em relação aos fretes relacionados à transferência de mercadorias para revenda entre estabelecimentos da empresa.

Conclusão

Tendo em vista os comentários apresentados acima, desde que os fretes sejam pagos a pessoas jurídicas e sofram a incidência das contribuições:

(i) é legítima a apropriação de créditos dePISS/COFINS relacionados ao frete contratado nas operações de aquisição de mercadorias, uma vez que o mesmo integra o custo de aquisição da mercadoria transportada, seja ela destinada à revenda ou à utilização como insumos no processo produtivo, desde que o.

(ii) há argumentos para defender que os fretes relativos à transferência de mercadorias entre a CD e a Fábrica, no âmbito do processo produtivo, pode constituir crédito dePISS/COFINS; e

(iii) há argumentos para defender que os fretes relativos à transferência de mercadorias entre a CD e a Revenda, pode constituir crédito dePISS/COFINS.

Entretanto, não se pode deixar de apontar que, especialmente no que se refere à transferência entre estabelecimentos do mesmo titular, de insumos ou de mercadorias adquiridas para revenda, existem Soluções de Consulta e uma decisão no STJ desfavoráveis à apropriação do crédito.

Sendo o que se fazia necessário para o presente momento, permanecemos à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais que se façam necessários.

Fonte:  JUSBRASIL

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